Estou de passagem neste mundo,

Mas deixo aqui o registro de minhas palavras.

Eu sou o peregrino do tempo.


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

SOBRE LYGIA

Este livro me é especial porque a assistente dela me ligou para dizer que ela tinha um presente para mim - ela se lembrou de mim! - e que eu fosse apanhá-lo na Academia de Letras. "Diga na portaria que você é meu convidado", isso ela mesmo disse. Ela me deu o livro autografado. Meu nome estava certinho; e antes dele vinha a palavra: escritor. Depois que os outros ancestrais já haviam ido pra casa, somente ela e eu ainda insistíamos nas risadas e conversa molhadas na cerveja gelada que o mordomo Luis nos servia. Fumávamos porque podia. Ora, quem manda alí é ela. Eu pouco falava... apaixonado por sua voz e narrativa, tal como outro homem descreve bem abaixo:

"...rimos, folgamos e bebemos. Não dramatizamos as diferenças na hora da discussão – entre escritores portugueses e brasileiros só por má-fé e cínica estratégia se instalará a discórdia. Recordo a hora do café da manhã, com o sol a entrar triunfante pelas janelas. Ao redor das mesas o riso dos novos não soava mais alto nem era mais alegre que o dos veteranos, os quais, por muito terem vivido, gozavam da vantagem de conhecer mais histórias e mais casos, tanto dos próprios como dos alheios. Não é uma ilusão minha de agora a imagem de terna atenção e respeito com que todos nós, portugueses e brasileiros, escutávamos o falar de Lygia Fagundes Telles, aquele seu discorrer que às vezes nos dá a impressão de se perder no caminho, mas que a palavra final irá tornar redondo, completo, imenso de sentido.

Disse que conheço Lygia desde sempre, porém a medida deste sempre não é a de um tempo determinado pelos relógios e pelas ampulhetas, mas um tempo outro, interior, pessoal, incomunicável." (JOSÉ SARAMAGO)